Leonor Cunha Mendes é finalista do curso de Design de Interiores da LSD Lisboa. Visitámos o seu atelier e conversámos sobre o percurso no curso e esta nova dimensão da sua prática artística.
“Acredito que os espaços que habitamos influenciam profundamente o nosso bem-estar, o nosso estado de espírito e até a forma como nos relacionamos com o mundo”
Leonor Cunha Mendes, aluna LSD
Podes começar por te apresentar aos nossos leitores?
Olá, o meu nome é Leonor Cunha Mendes e sou aluna do curso de Design de Interiores na LSD Lisboa. Sou licenciada em Pintura pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, com um Minor em Desenho de Modelo e desde 2022 que exponho regularmente o meu trabalho.
Desde muito cedo desenvolvi um profundo interesse pelo mundo artístico. Aos três anos, comecei a ter contacto com a História da Arte através da minha avó, que me introduziu aos grandes mestres da pintura através dos seus livros. Sempre pintei e desenhei nos meus tempos livres e, aos oito anos, comecei a ter aulas de Desenho e Pintura num atelier, onde permaneci até ingressar na Faculdade de Belas-Artes, e onde hoje dou aulas.
Quando e como é que a pintura entrou na tua vida?
A pintura sempre fez parte da minha vida e sempre surgiu como uma forma muito íntima de expressão. Pintar é, para mim, uma forma de comunicar e de mostrar o que sinto e a forma como vejo o mundo, sem precisar de palavras. Desde criança que tenho de desenhar e pintar, de experimentar misturar cores e materiais.
Desenhar e pintar sempre foram formas muito naturais de estar no mundo para mim. Mais do que um impulso criativo, são maneiras de pensar através do gesto, de me aproximar das coisas e de lhes dar atenção.
Assim, com 18 anos, decidi que queria estudar em Belas-Artes, no curso de Pintura, e aprofundar os meus conhecimentos nesta área. Por gostar muito de figura humana, tirei um minor em Desenho de Modelo.
O que te inspira no teu processo artístico?
O que me inspira são as pequenas coisas do quotidiano que muitas vezes passam despercebidas na correria da rotina. Tento procurar a beleza nas coisas mais simples. Temas como a memória, o silêncio, a nostalgia, o sonho e a passagem do tempo são bastante recorrentes no meu trabalho.
As minhas obras têm sido fortemente influenciadas pelas imperfeições e pelo efeito desvanecido das fotografias analógicas, da infância dos nossos pais e avós. Fascina-me a sua paleta de cores quase monocromática, em tons de terracota e lilás, que tem a capacidade de nos transportar para outro sítio.
Sou profundamente movida por sentimentos e atmosferas e gosto de explorar a presença da figura humana como forma de criar uma narrativa e proximidade com o observador. Interesso-me em representar lugares que guardam memórias, que parecem contar histórias em silêncio; espaços que sugerem vivências, emoções e estados de espírito.
“Queria continuar a criar, mas de uma forma que se ligasse mais diretamente à vida das pessoas.”
Leonor Cunha Mendes, aluna LSD
O que te motivou a estudar Design de Interiores?
Expandir a minha prática artística para o universo dos espaços surgiu de forma natural. Sempre tive uma grande curiosidade pelo universo do design de interiores e o sonho de, um dia, poder estudar e trabalhar nesta área.
Depois da licenciatura em Pintura, comecei a sentir uma vontade crescente de levar a minha prática artística para algo mais tridimensional. Queria continuar a criar, mas de uma forma que se ligasse mais diretamente à vida das pessoas.
Acredito que os espaços que habitamos influenciam profundamente o nosso bem-estar, o nosso estado de espírito e até a forma como nos relacionamos com o mundo. Por isso, surgiu em mim o desejo de aplicar a sensibilidade que desenvolvi na pintura à criação de ambientes que tenham impacto real no quotidiano, criando espaços com alma, que transmitam conforto e que sejam práticos e funcionais.
Na tua perspetiva, de que forma a pintura e o design de interiores se complementam?
Para mim, a pintura e o design de interiores complementam-se de forma muito natural. As duas áreas partem de um olhar atento e sensível sobre o mundo e procuram causar impacto através da cor, da luz, da composição e das texturas.
A pintura ensinou-me a parar para olhar, a reparar nos detalhes; para depois poder criar atmosferas com recurso à cor, à textura e ao gesto. E essa sensibilidade passou, de forma quase instintiva, para os espaços que agora começo a projetar.
Vejo esta área como uma extensão natural daquilo que sempre fiz: uma ponte entre a arte e a vida, entre a liberdade criativa e as necessidades reais das pessoas. É um lugar onde a arte se cruza com a arquitetura, com as emoções e com a experiência do espaço, onde posso contribuir para tornar os ambientes mais acolhedores, mais humanos e com mais significado.
Sentes que o curso de Design de Interiores na LSD tem influenciado a tua forma de criar? De que forma?
Sempre tive uma forma de criar muito espontânea e visual, muito guiada pela emoção, algo que vinha naturalmente da pintura. Quando entrei no curso, percebi rapidamente que não bastava ser bonito: tinha de ser funcional. Isso obrigou-me a pensar de forma diferente, mais prática e estratégica, e trouxe desafios totalmente novos.
Aprendi a considerar outros fatores, como a circulação num espaço, a ergonomia, os materiais e a iluminação. Tudo isso começou a fazer parte do meu processo criativo e isso acabou por dar uma nova profundidade ao meu olhar.
Hoje sinto que crio com mais intenção, mais consciência do impacto que um espaço pode ter na vida de alguém. O curso tem sido mesmo uma constante aprendizagem, às vezes confortável, outras vezes desafiante, mas sempre estimulante.
Algo que mudou bastante a minha forma de trabalhar foi perceber que, ao contrário da pintura, aqui não se trata só do meu gosto. Há sempre alguém do outro lado, e o desafio está em encontrar soluções que reflitam a identidade do cliente, sem perder a minha linguagem. Isso obrigou-me a sair da minha zona de conforto e a arriscar, o que tem sido muito bom.
“Quando entrei no curso, percebi rapidamente que não bastava ser bonito: tinha de ser funcional. Isso obrigou-me a pensar de forma diferente, mais prática e estratégica, e trouxe desafios totalmente novos.”
Leonor Cunha Mendes, aluna LSD
Fala-nos sobre a tua exposição: qual é o nome, onde e quando vai acontecer?
A exposição tem o nome de “São ou Não” e estará patente até 31 de agosto, no novo espaço da Galeria São Mamede, na Rua Maestro Pedro Freitas Branco, 11 A/B.
É uma exposição coletiva de 16 novos artistas- Abel Mota, Fábio Araújo, Joana Teixeira, Leonor Cunha Mendes, Lucrezia Bracci, Luísa Saldanha, Mafalda Cunha, Margarida Almeida, Maria Rebela, Nadya Ismail, Nuno Ferreira, Patrícia Assis, Pedro Pena, Sara Alves, Sara Atrouni e Tomás Toste- com foco em Pintura e Escultura, mostrando uma pequena seleção de obras de cada um deles.
Qual é o conceito central desta exposição?
O intuito desta exposição é mostrar o trabalho de artistas emergentes, sendo uma iniciativa que vem a dar “palco” a jovens artistas e artistas emergentes residentes em Portugal, representantes de uma nova geração que foram selecionados pelo seu potencial e talento demonstrados.
Tenho expostas três obras: uma pintura a óleo sobre tela, intitulada Na Sombra do Tempo, e dois desenhos de carvão e gesso acrílico sobre MDF, intitulados de Quando Invadiu o Vazio I e III.
Estes trabalhos procuram resgatar fragmentos de experiências pessoais e coletivas, evocando imagens que habitam o limiar entre o real e o imaginado. São resultado da minha exploração em torno da temática do sonho e da nostalgia, onde procurei criar composições em que o tempo parece suspenso — como se cada imagem estivesse presa entre o “antes” e o “depois”.
Através da escolha dos materiais e da paleta contida, quis dar corpo a atmosferas silenciosas, íntimas, quase cinematográficas, em que o vazio ganha presença e as figuras parecem emergir de uma memória difusa. Há uma tentativa de tocar o invisível; aquilo que sentimos, mas não sabemos nomear.
Estas peças são também um convite à contemplação lenta, a um olhar mais atento, onde cada detalhe pode revelar uma emoção, uma ausência ou uma lembrança esquecida.
Como gostarias que as pessoas se sentissem ao visitar a tua exposição?
Gostava que as pessoas se sentissem transportadas, nem que fosse por instantes, para um lugar diferente do habitual. Que se sentissem envolvidas, como se a exposição despertasse nelas memórias, sensações ou reflexões. Gostava que houvesse espaço para o silêncio e para contemplação, mas também para inquietação e curiosidade. Se, ao saírem, levarem consigo algo de novo, então sinto que a exposição cumpriu o seu propósito.
Que mensagem deixas a quem está a pensar em seguir um caminho criativo, seja na arte, no design ou em ambos?
A quem está a pensar seguir um caminho criativo, diria para confiar na intuição e aceitar que o percurso vai ser tudo menos linear, e que está tudo bem com isso. É um caminho feito de descobertas, dúvidas, pequenas vitórias e muitas mudanças de direção. Mas é também um dos mais ricos e transformadores, porque nos obriga a olhar para dentro e para fora com atenção.
Gostava de ter ouvido, no início, que não é preciso ter tudo claro desde o primeiro momento, que é natural não saber exatamente para onde se está a ir, e que o mais importante é continuar a criar, a experimentar, a observar o mundo com curiosidade.
Também gostava de ter ouvido mais vezes que há espaço para cada pessoa, mesmo num meio competitivo, porque cada olhar é único, e o que tens para dizer só pode ser dito por ti.
Convidamos todos a conhecerem o trabalho da Leonor na exposição coletiva "São ou Não" que estará patente na Galeria São Mamede até 31 de agosto.
A equipa LSD.